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Minuto da Semana
(O surgimento da razão e da imagem na pólis grega - Breve artigo sobre meu TCC em Filosofia)
Olá pessoal, no "Minuto da Filosofia" desta semana, gostaria de compartilhar com vocês um resumo do meu TCC (Trabalho de Conclusão de Curso) em Filosofia, intitulado "O Surgimento da Razão e da Imagem na Pólis Grega". No artigo abaixo, abordo brevemente os principais pontos da minha pesquisa. Ao final desta postagem, disponibilizarei um link para que possam baixar o TCC completo, caso desejem explorar mais a fundo o tema.
Vamos lá! Prontos para mergulhar na leitura? 📚
Introdução
A transição do pensamento mítico para o pensamento racional na Grécia Antiga é um importante marco histórico para a compreensão da formação do pensamento ocidental. Este artigo examina as circunstâncias que propiciaram o surgimento desse novo paradigma de entendimento do mundo, centrando-se principalmente no papel desempenhado pelas cidades-estado gregas (pólis), (FLORENZANO, 2010), bem como no tocante à imagem, que nesse contexto passa a ser pública (GUARINELLO, 2013).
O Declínio do Pensamento Mítico e a Ascensão da Razão
Antes do século VI a.C., a visão de mundo dos gregos era predominantemente pautada pelo pensamento mítico (VERNANT, 2018). Os mitos, narrativas ficcionais que explicavam a origem do mundo e os fenômenos naturais, eram a principal fonte de conhecimento e compreensão da realidade (ARANHA; MARTINS, 2018). No entanto, esse paradigma começou a ser gradualmente questionado e substituído por uma nova forma de entendimento, baseada na razão e na busca por explicações naturais (MARCONDES, 2007).
Esse desenvolvimento do pensamento racional ocorreu principalmente nas cidades jônicas, como Mileto, onde filósofos como Tales, Anaximandro e Anaxímenes propuseram modelos explicativos da natureza (physis) fundamentados em causas naturais, em oposição às explicações mitológicas (BURNET, 2006). Esses pensadores conseguiram desenvolver um vocabulário mais abstrato e laico para tratar da realidade, rompendo com a visão mítica do mundo (BOTELHO, 2015).
A Importância da Pólis para o Surgimento da Razão
O surgimento da razão na Grécia Antiga está intimamente ligado ao advento das cidades-estado (pólis). Essas cidades, com sua organização política, econômica e social baseadas na publicidade e no debate, criaram um ambiente propício para o florescimento do pensamento racional (FLORENZANO, 2010).
Nas pólis, especialmente naquelas situadas nas colônias gregas do Mar Egeu, havia intensa atividade comercial e convivência de diferentes tradições culturais. Essa diversidade levou os gregos a relativizar o caráter absoluto e global das explicações míticas, uma vez que cada povo possuía sua própria maneira de entender o mundo (GUARINELLO, 2013). Diante dessa pluralidade de visões, tornou-se necessário buscar formas racionais de compreensão da realidade (VERNANT, 2018).
Além disso, as crescentes demandas práticas da vida nas cidades, como as atividades comerciais e políticas, fizeram com que o mito perdesse gradualmente sua importância como principal fonte de conhecimento (ARANHA; MARTINS, 2018). Nesse contexto, a razão ganhou destaque como um modo de entendimento mais adequado às necessidades da pólis (BURNET, 2006).
O Surgimento da Imagem na Pólis Grega
Além das transformações no pensamento, o advento da pólis também trouxe mudanças significativas na forma como as imagens eram compreendidas e representadas na cultura grega (FLORENZANO, 2010).
Antes do período das cidades-estado, as imagens divinas, chamadas de ídolos (xóanon, brétas), estavam intimamente ligadas aos ritos e cultos privados, sendo guardadas em espaços restritos, como as residências dos sacerdotes (VERNANT, 2009). Esses ídolos não eram representações figurativas, mas símbolos sagrados que propiciavam a comunicação com o divino (ARANHA; MARTINS, 2018).
No entanto, com o surgimento da pólis, as imagens dos deuses migraram para os templos públicos, tornando-se acessíveis ao olhar do cidadão comum (GUARINELLO, 2013). Essa publicidade das imagens divinas representou uma ruptura com o caráter oculto e privado dos ídolos anteriores (VERNANT, 2018).
Além disso, as imagens passaram por uma transformação, deixando de ser meros símbolos sagrados para se tornarem representações figurativas dos deuses. Essa transição da apresentação do divino para a representação do divino refletiu a emergência de uma nova mentalidade, em que a imagem ganhou um status de ilusão e imitação da aparência das coisas (FLORENZANO, 2010).
Dessa forma, o surgimento da imagem pública nos templos da pólis acompanhou o processo de racionalização do pensamento grego, contribuindo para a relativização do pensamento mítico e a ascensão de uma nova forma de compreender o mundo (VERNANT, 2018).
Conclusão
O surgimento da razão e da imagem na Grécia Antiga foi um processo complexo, marcado pela transição do pensamento mítico para o pensamento racional (BURNET, 2006). Esse desenvolvimento foi impulsionado pelo advento das cidades-estado gregas, que proporcionaram um ambiente favorável ao florescimento de uma nova forma de compreender o mundo, baseada na explicação racional, na busca por causas naturais e na representação figurativa do divino (ARANHA; MARTINS, 2018).
A razão e a imagem emergiram, portanto, como respostas às necessidades da vida na pólis, superando as limitações do pensamento mitológico e inaugurando uma nova era no pensamento ocidental (VERNANT, 2018).
Referências Bibliográficas:
SOUZA, Agenor Henrique de. O surgimento da razão e da imagem na pólis grega. 2022. 65 folhas. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Filosofia) – Universidade Federal de Lavras, Lavras, 2022.
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: Introdução à Filosofia. 6. ed. São Paulo: Editora Moderna, 2018.
BAUER, Simoni de; ALVES, Ana Cristina Zecchinelli; OLIVEIRA, Caroline Silveira. História Antiga. Porto Alegre: Sagha Educação, 2019.
BOTELHO, José Francisco. Uma breve história da filosofia. São Paulo: Abril, 2015.
BURNET, John. A aurora da filosofia grega. Tradução de Vera Ribeiro; revisão da tradução de Agatha Bacelar; tradução das citações em grego e latim Henrique Cairus, Agatha Bacelar, Tatiana Oliveira Ribeiro. Rio de Janeiro: Contraponto; Ed. PUC-Rio, 2006.
FLORENZANO, Maria Beatriz Borba. A origem da Pólis: os caminhos da Arqueologia. In: CORNELLI, Gabriele (org). Representações da Cidade Antiga: categorias históricas e discursos filosóficos. Coimbra: Universidade de Coimbra, 2010. Disponível em: https://digitalis-dsp.uc.pt/bitstream/10316.2/31507/6/3-representacoes_da_cidade_antiga_artigo.pdf. Acesso em: 30 maio 2021.
GAARDER, Jostein. O mundo de Sofia: romance da história da filosofia. São Paulo: Companhia das Letras, 2012.
GUARINELLO, Norberto Luiz. História Antiga. São Paulo: Contexto, 2013.
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HAVELOCK, Eric. Prefácio a Platão. Tradução de Enid Abreu Dobránzsky. Campinas, SP: Papirus, 1996.
MARCONDES, Danilo. Iniciação à história da Filosofia: dos pré-socráticos a Wittgenstein. 2. ed. rev. ampl. Rio de Janeiro: Zahar, 2007.
MONZANI, Juliana Caldeira. A administração micênica em Creta: um estudo dos vasos com inscrição em Linear B. 2019. Tese (Doutorado em Letras e Ciências Humanas) – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2019. Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8138/tde-27022020-141638/publico/2019_JulianaCaldeiraMonzani_VCorr_V2.pdf. Acesso em: 31 maio 2021.
MORAIS, Rui; AREZES, Andreia. Minoicos: os guardiões da primeira civilização. Coimbra: Universidade de Coimbra, 2019.
PLATÃO. República. Tradução de Maria Helena da Rocha Pereira. 9. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001.
VERNANT, Jean Pierre. As Origens do Pensamento Grego. 24. ed. Tradução de Ísis Borges B. da Fonseca. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2018.
VERNANT, Jean Pierre. Entre o Mito e a Política. 2. ed. Tradução de Cristina Murachco. São Paulo: EDUSP, 2009.
Minuto da Reflexão 🤔
O estudo do surgimento da razão e da imagem na pólis grega nos revela a complexidade e a riqueza do processo de transformação do pensamento e da cultura na Grécia Antiga. Esse movimento não se deu de forma linear ou simplista, mas foi marcado por rupturas, tensões e sobreposições entre diferentes modos de compreender o mundo. O texto demonstra como o advento das cidades-estado gregas criou as condições socioeconômicas e culturais favoráveis ao florescimento de uma nova racionalidade, ao mesmo tempo em que propiciou a migração das imagens divinas do espaço privado para o espaço público. Essa articulação entre o surgimento da razão e da imagem pública revela a profunda interconexão entre transformações no plano do pensamento e no plano das representações simbólicas. Compreender esse processo é fundamental para entender os alicerces sobre os quais se ergueu o pensamento ocidental. Espero que tenham gostado, deixem nos comentários a sua opinião, isso nos incentiva a criar cada vez mais conteúdos esclarecedores pra vocês. Obrigado e até semana que vem. Fiquem com Deus.🙏
Texto publicado em: 06 Abr 2024.