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Minuto da Semana
(O mal radical e o mal absoluto)
Olá pessoal, no "Minuto da Filosofia" desta semana, vamos explorar o pensamento ético de Kant, uma perspectiva que Hanna Arendt afirmou ter levado à conclusão de que o mal praticado pelos regimes totalitários é o mal absoluto. É fundamental compreender o significado desse conceito, pois não se trata apenas do espanto diante de algo considerado mal absoluto; é uma conclusão decorrente de uma reflexão filosófica. Vamos fazer um rápido afastamento do tema principal para discutirmos de forma breve a ética kantiana e compreender essa ideia.
Ética Kantiana
Na edição anterior, discutimos o tema a "banalidade do mal" explorado pela filósofa Hanna Arendt, cujo profundo envolvimento com as ideias de Immanuel Kant é digno de destaque. Na ética kantiana, ressalta-se o conceito do imperativo categórico, o qual enfatiza a importância do dever, a execução deste dever e o respeito à lei moral. O imperativo categórico propõe a seguinte máxima: "Age de modo tal que a norma da tua ação possa valer como a lei universal, como uma regra universal." Esse princípio implica que uma ação ética vai além de meros interesses pessoais e egoístas, visando, em vez disso, o benefício comum e a promoção da fraternidade.
Para Kant, uma ação boa é aquela que supera a inclinação natural ao amor próprio. Agir de forma ética significa agir em conformidade com o dever, independentemente de trazer benefícios pessoais. Agir buscando primariamente o benefício próprio e relegar o dever a algo contingente (que pode acontecer ou não) é considerado uma má ação na ética kantiana.
Kant argumenta que o ser humano possui uma inclinação natural ao egoísmo, mas a beleza da ética kantiana reside na demonstração de que somos seres livres, capazes de escolher entre cumprir o dever moral ou agir de acordo com a inclinação egoísta.
O Mal Radical
Na edição anterior eu abordei superficialmente este conceito. Hoje nós vamos falar um pouco mais à respeito. A inclinação inata do ser humano para agir de maneira contrária à moralidade, independentemente de circunstâncias externas, é um fenômeno conhecido como o mal radical. O termo "radical" aqui deriva do latim "radix", que significa raiz, indicando que este mal está enraizado na natureza humana. Segundo essa perspectiva, o mal radical surge quando invertemos a hierarquia moral, priorizando o interesse pessoal acima do dever moral.
Para o filósofo Immanuel Kant, o mal radical representa uma violação direta da moralidade e ocorre quando colocamos nossos interesses egoístas acima dos princípios éticos. Nesse sentido, é visto como uma expressão do egoísmo humano que vai contra as normas morais que devemos seguir. Portanto, para Kant, o mal radical está enraizado na natureza humana quando desviamos da moralidade em prol de interesses pessoais. Mas Kant vai além e propõe hipoteticamente uma outra possibilidade de mal, que seria o mal absoluto.
O Mal Absoluto
Essa outra possibilidade seria a de de um sujeito buscar o mal pelo mal, algo que transcenderia o mal radical e seria quase diabólico. Hannah Arendt, ao confrontar o totalitarismo, identifica uma forma de mal absoluto. Este não é o mal radical comum, decorrente da busca do próprio interesse, mas um mal que se busca como finalidade. Dentro do totalitarismo, indivíduos agem sem considerar seu próprio bem-estar, levando a atos de pura maldade, desvinculados de motivos pragmáticos ou interesses políticos.
A análise de Hannah Arendt sobre o totalitarismo como mal absoluto destaca a gratuidade dessas ações, demonstrando uma ausência de sentido e justificativa pragmática. Ao depararmos com imagens chocantes, como as das pilhas de cadáveres, câmaras de gás e crematórios resultantes da produção indiscriminada de morte nos campos de concentração nazistas, percebemos a natureza do mal absoluto. Essa malevolência se manifesta de forma gratuita, desprovida de razão aparente.
Apesar de Hannah Arendt ter inicialmente categorizado o totalitarismo como um mal absoluto, uma mudança conceitual ocorre quando ela confronta o julgamento de Eichmann, um dos principais responsáveis pela deportação dos judeus europeus durante o Holocausto, conforme discutido na edição passada (edição 10). Caso ainda não tenha lido, recomendo a leitura agora. 👉 A banalidade do mal.
Agora é hora de refletir
Quando falamos sobre o mal, existem três ideias importantes. Primeiro, temos o mal radical, que acontece quando alguém deixa seus próprios interesses atrapalharem o que é certo. Depois, há o mal banal, que é quando as pessoas fazem coisas ruins no dia a dia sem pensar muito sobre isso. E, por fim, o mal absoluto, que está relacionado a governos totalitários e representa a maldade sem motivo aparente, apenas pelo desejo de fazer o mal, ou seja, o mal pelo mal. Essas ideias nos fazem refletir sobre as complexidades do mal em diferentes situações da vida. É isso pessoal, obrigado e até a próxima edição.
Texto publicado em: 13 Jan 2024.